terça-feira, dezembro 30, 2014
domingo, dezembro 28, 2014
EM LOUVOR DE LYDIA...
Em seu desenfado no Olimpo jogam os deuses
aos dados
E concedem-nos esta hora...
Ergamos a taça.
E celebremos, Lydia!...
A flor que colho
poderia não ser.
Bastaria que
outra fosse a cor
Com que enfeito
teus cabelos...
Mas os cabelos
são loiros e vermelha a flor.
Isso nos basta!...
Recolhe pois a inquieta
ruga. E o arrepio.
Que o Universo é
apenas filosofia.
Uma infinita
forma abstracta por onde descemos
Até ao rio que
nos leva
E a brisa que
nos guia...
Entrelacemos os dedos, Lydia!
Que o rosto dos
homens é frágil tela
Por onde a Sombra
perpassa.
E a água se
derrama e se mistura
Com a cor das
dores
E da alegria...
Beijemo-nos!
Que a hora
passa, Lydia,
E a tarde cai.
E há fios de Sol
A bailar em teus
cabelos.
Ainda!...
Manuel Veiga
Nota
– Como se sabe, Lydia é uma criação literária de Ricardo dos Reis.
.....................................................................
Votos de Bom Ano!...
Carpe diem!
sexta-feira, dezembro 26, 2014
SUAVES SORTILÉGIOS...
Falam-me estes
dias de suaves sortilégios
Quando os olhos
sorriam na ternura de um afago
E teu regaço,
Mãe, era altar e refrigério…
Não havia
profusão de cores. Nem artificio.
Tudo se resumia
à singeleza de teus dedos
Ajeitando o musgo
sobre a pedra.
E a imaginada
gruta onde construías o milagre
Aninhando-se em
mim: – Deus menino!...
Que o outro
Menino era apenas pretexto.
Natal que tu não
sabias, então, Mãe, mas eu sei.
Hoje!...
E em que incréu
teimo!...
E a mãe celeste
era a amorável devoção
Com que enfeitavas
o caminho. E deitavas
Nas palhinhas o
meu olhar deslumbrado
E o doce
encantamento…
E a liturgia
imaculada do presépio!...
E esta eterna
dor da ausência. E tua presença
Iluminada que
pressinto em cada passo!…
Manuel Veiga
terça-feira, dezembro 23, 2014
domingo, dezembro 21, 2014
sexta-feira, dezembro 19, 2014
NOTÍCIAS DE BABILÓNIA LXVII
“Gloria
in excelsis Deo...”
Gosto
de pessoas. Por vezes próximas, respirando ao mesmo ritmo!.. Outras (quase
sempre) apenas momentos, riscos de acaso, meteoritos intensos na solidão da
cidade. Uma viagem de autocarro (ou de metro) é sempre uma revelação
inesperada. Pequenos nada que nos perseguem (momentos, horas, dias?) e que
exigem que os soltemos, de tão intensos...
Gosto
de gente anónima. De seus rostos. Da linguagem subtil dos seus gestos. Do seu
porte. Do pulsar do meu Povo!...
Por
vezes, a cor desânimo, toma o sangue. O cepticismo cria raízes e uma ironia
triste ocupa o espaço da esperança. Porém, do meio da multidão, surge tantas
vezes, sem nos darmos conta, uma imagem, o resto de uma carícia, uma ternura,
uma beleza inesperada que humaniza e reconforta. Que nem sempre estamos
disponíveis para ver e que, outras vezes, guardamos como refrigério de alma...
Falo-vos
de uma viagem de autocarro entre o Rossio e o Cais de Sodré. Na curta
distância, cenas dignas de um pintor impressionista - o melhor e o pior de um
Povo concentrado no escasso espaço de um autocarro, à hora de ponta. Nada que
seja diferente de outras viagens.
Até
que...
Uma
jovem mãe, de rosto trigueiro e olhar apaziguado, entrou, aconchegando no colo
uma criança de escassos meses. Sozinha, face as intempéries e os balanços da
vida, ali bem simbolizados nos apertos e balanços do autocarro. Um jovem, de
brinco na orelha e crista de galo loira, cede-lhe o lugar (no meu íntimo, um
sorriso freak!)
Acomodou-se
a “minha" jovem Madalena (era, de certo, este o seu nome!) com o bebé nos
braços, sereno que nem um anjo. E alheia a tudo que não fosse a sua novel
maternidade, a jovem soltou o seio da blusa (mármore puro) e a boca da criança,
em esplendor, buscou afoita o mamilo, assim exposto em dádiva!
Vi
então olhares brilhantes nos rostos cansados dos transeuntes. Vi ternuras
caladas e inesperados silêncios. Vi orações pagãs em cada sorriso!...
E,
em época natalícia, a minha alma ateia, entoou um cântico de vida -
"Glória in excelsis Deo!..."
Manuel
Veiga
FELIZ
NATAL!...
quarta-feira, dezembro 17, 2014
terça-feira, dezembro 16, 2014
CURVAM-SE OS DIAS...
Curvam-se os
dias. E no declive
A íntima inquietude
de meus passos...
Amável embora a sombra
espraia-se
Em azul neutro. Névoa
desprendida
A derramar
prenúncios. Quase tímida.
Dulcificando a
erosão da cor e abrindo-se
Vagabunda ao seu
destino espúrio...
Sem alardes. Que
nada pode a subtileza do voo
Nem a coada luz
da nuvem...
Apenas a rota das
trevas e a imanência do sopro
A moldar a curva
e a frágil senda
E os calcinados sonhos
Do poeta...
Manuel Veiga
segunda-feira, dezembro 15, 2014
sexta-feira, dezembro 12, 2014
FLAMEJANTES OS MASTROS...
Flamejantes os
mastros. E as colinas.
Em nuas
confluências
De abraços. E de
pétalas...
Derramam-se na
cidade rios e memórias.
E soltam-se os
poetas. E os murais...
Em gesto largo
sobre o gume dos olhares
Maiakóvski –
vindo de um Futuro grisalho
De saudade e de tanta
persistência! –
Abre-se no
palco...
E grita em seu
jeito gutural e bárbaro:
-“Este é o meu Povo. Ainda!...”
A seu lado, a
Mulher de Vermelho
Solta a lágrima
da fome
E a criança
loira das espigas...
E
- Palavra de
cristal em riste! -
Arranca os olhos
e rasga-se em febre
E pitonisa
inflama-se na língua e nos prenúncios
E ergue-se na
aurora dos dias que hão-de vir...
Na densa nuvem
alvoroçada
A multidão
ignara ri e chora...
E um velho
caminheiro alquebrado -
De fadigas e da
idade - sobe então ao mais alto dos mastros
E ascende em
lume o rubro das bandeiras...
Manuel Veiga
terça-feira, dezembro 09, 2014
Corrosão da água sobre a pedra...
Derrama-se a
palavra no corpo da escrita
Sem mais nada.
Leve fissura apenas.
Milimétrica.
A imiscuir-se na
tensão da espera. Como se arqueologia fora.
A corroer por
dentro
Sem plano
Ou guia...
Mistura dissolvente.
Benigna.
Corrosão de água
sobre a pedra.
E alquimia do verso
fugidio
E do incauto
morfema...
Como se a
inesperada espera fosse
Bicho alado. Já não apenas pedra.
Inquietação do poeta a engendrar
As cores do poema...
Inquietação do poeta a engendrar
As cores do poema...
E a dissolver a
água e a pedra
Nas dores da
hora.
E na escrita maior
Do Mundo!...
Manuel Veiga
domingo, dezembro 07, 2014
NOTÍCIAS DE BABILÓNIA LXVI
Mais que “case study”, Babilónia é um caso estudado...
Hammurabi, o legislador, com o mar a bater
na rocha, dos babilónicos faz alegres mexilhões...
Vende anéis e os dedos – e garante que os “vistos de oiro” são a
salvação da Pátria...
A Praça encolhe os ombros. E, ávida,
sorve o grande Espectáculo. Que as atribulações da justiça e os média alimentam
- "sabidamente..."
...................................
E uma ostra empedernida, com o Futuro no
ventre: “Babilónicos mergulhem fundo e aguentem
as ondas – não há parto sem dor, nem amanhãs sem trabalho...”
quinta-feira, dezembro 04, 2014
SÃO DE BRUMA OS TEMPOS...
São de bruma os
tempos. E de barcos destroçados.
E gemidos que os
escravos embandeiram
Como hinos...
São de bruma os tempos:
apocalípticos...
Nas galés os cães
devoram-se nos restos
E os sacerdotes
queimam as vestes
E cobrem-se de
cinzas
No interior das
praças...
A cidade treme: são
de bruma os tempos!...
No céu
baralham-se as estrelas.
E as bússolas rasgam
o norte no ventre das pedras
E na sede dos
homens.
São de bruma os
tempos!...
E nas inesperadas
sarças
E no cume das
montanhas
E no sol
encoberto ainda desta aurora
E no vento de
todas as profecias
E na insubmissão
do grito
E ardor de todas
as batalhas
E no azul das
crianças famélicas e nuas
E na enxada de
esperança
E nas torrentes da
memória
E nesta
safara...
São de bruma os
tempos: ainda!
E planto a dor. E
a bruma. E minha árvore – fio de água -
E minha palavra avara.
E celebro.
E rasgo.
E ilumino.
E proclamo da
alvorada dos tempos
A fecunda
claridade
Dos dias
peregrinos.
Manuel Veiga
terça-feira, dezembro 02, 2014
Do Fim da História à Rarefacção dos Acontecimentos...
Estamos
confrontados – dizem os historiadores – não com o fim da História, mas
porventura com algo mais catastrófico, ou seja, com uma espécie de “rarefacção dos acontecimentos” perante
a qual a história se tornou impossível.
Explicitemos
esta ideia. Com a queda do Muro de Berlim e a falência do sistema soviético, o
capitalismo “canibabilizou” todo o sentido de negatividade. Onde até então
existia dialéctica ergue-se agora um percurso de sentido único. Onde até então
a densidade dos factos se projectava nas consciências e empolgava militâncias,
hoje os factos despenham-se na sua profusão e nos efeitos especiais com que a
comunicação social os apresenta, banalizando-os, encharcando o quotidiano com
marasmo do idêntico por toda a parte.
Na
política, na cultura, nos média, na moda e até nas próprias causas que, mesmo
quando se apresentam como “fracturantes”, são as mesmas, seguindo o mesmo
padrão de sentido único...
Hoje,
tudo se passa em tempo real. Já não há mais lugar à verdade real dos
acontecimentos. Tudo se resume agora à coerência dos factos, imediatamente
apreensível no alinhamento dos telejornais. Sabemos tudo, a toda a hora, na
espuma do quotidiano...
A
história fica paralisada, não por ausência de acontecimentos, mas pela lassidão
das consciências, empanturradas de informação. As chamadas maiorias
silenciosas, a imensa indiferença das massas humanas, a falta de mobilização
cívica têm certamente diversas explicações. Mas a inércia social não resulta
seguramente por falta de motivos para acção cívica e política...
Nesta
espécie de auto dissolução da história, todos os mecanismos da democracia
política se degradam. E, nessa degradação, se precipitam valores políticos,
cívicos e morais. As próprias exigências do exercício da liberdade e de
respeito dos direitos do homem não passa de um simulacro.
“A democracia planetária dos direitos do
homem está para a liberdade real está como a Disneylandia está para imaginário
social” – escreve Jean
Baudrillard num livro célebre (A Ilusão do Fim – ou a greve dos
acontecimentos).
Se
com o colapso do sistema soviético, o capitalismo devorou, como uma paródia
universal, a dialéctica e a história, ao assumir todos contrários, numa
grotesca síntese sem alternativa, é porque, na sua veleidade de dominação
totalitária, devora a própria substância do ser humano para o reduzir à sua
essência de ser produtivo...
Salva-se,
porém, a cultura da liberdade e dos direitos do homem! Mas salva-se?...
Que
os digam os milhões e milhões de “gente
descartável”, que à escala planetária são afastados, como excedentes
(mercadoria, portanto) do processo de produção e de consumo.
Que
o digam as prostitutas na Tailândia, os índios no Brasil, os escravos na
Mauritânia, as crianças e as mulheres em Ceilão, no Paquistão ou na Índia! Que
o diga África! Que o digam, nos Estados Unidos da América, os muros de milhares
de quilómetros electrificados e a vigilância electrónica (e os rifles)
apontados aos emigrantes mexicanos!...
“Da liberdade já só resta a ilusão
publicitária, isto é, o grau zero da ideia, a que regula o regime liberal dos
direitos do homem" (...) –
exclama o autor referido, ou seja, “a
promoção espectacular, a passagem do espaço histórico para o espaço
publicitário, passando os média a ser o lugar de uma estratégia temporal de
prestígio...”
Construímos
a memória síntese dos nossos dias, mediante a profusão de imagens publicitárias
que nos dispensam da participação dos acontecimentos realmente transformadores
da vida e da sociedade
Nesta
antecipação publicitária, se canibaliza o futuro e se procede à reciclagem dos "detritos" da história e dos
mitos. Também os pais fundadores da nação norte americana, em nome da
liberdade, permitiram a escravidão!...
Resta-nos
a convicção que, ao longo dos tempos, sempre os escravos se revoltaram... E
que, em seu "surdo ruído",
a História prossegue seu caminho.
Bem
se sabendo quão duras são suas dores...
Manuel
Veiga
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