Ao que consta, a senhora Merkel, tendo
em vista chutar os gregos depois do imbróglio das últimas eleições, terá
sugerido ao Presidente da Grécia, que procedesse à realização de um referendo
sobre a permanência daquele país na zona euro.
Os círculos políticos de Berlim
apressaram-se, porém, a fazer o desmentido e, a partir daí, “nada se passou”, pois não será certamente o senhor Papoulias, nesta
fase do campeonato, perante vulnerabilidade de seu País e os dramas de seu
povo, quem irá desmentir a chanceler alemã.
Nem, em rigor, para o que pretendemos
dizer, interessará tanto saber se sim ou não, mas, sobretudo, registar que a
notícia surgiu e fez seu curso nos meios políticos e nos media nacionais e internacionais.
Portanto, “si non è vero, è bene trovato...”
Insisto que, para o que está em causa não
é tanto e existência real dos factos, mas o valor facial da notícia, ou seja, a
respectiva a verosimilhança. Na realidade, é relativamente secundário saber se
a senhora Merkl telefonou ao presidente grego, admitiu telefonar ou simplesmente
a ideia do referendo foi apenas uma “criação” de seus conselheiros políticos.
O que me parece que tem importância no
caso, é a constatação (mais uma) de que, para algumas mentes e os poderes
europeus, a democracia e os seus mecanismos de expressão cívica se podem mercadejar
ao sabor dos interesses económicos e políticos de momento.
Quem não se lembra, poucos tempos atrás,
que o senhor Papandreou, chefe do governo grego, legitimado pelo voto popular, foi
intimado a apresentar-se à dupla “Merkozy” em Cannes, onde decorria uma cimeira
do chamado G20, liminarmente defenestrado e substituído nas suas funções por um
tecnocrata ao serviço dos ditames do mercado e das serventuárias políticas
europeias?
Qual o “crime”? Teria o senhor Papandreou
renunciado às suas convicções europeístas? Ou teriam abdicado os gregos do seu
Estado, limitado que seja na sua soberania? Ou até mesmo teriam abjurado a sua
dívida soberana? Não!... O único sinal de heterodoxia foi o primeiro-ministro
Papandreou afirmar que iria sujeitar o programa da tróica e o garrote das imposições
a consulta popular.
Tanto bastou, portanto, para o primeiro-ministro
grego fosse despedido por indecente e má figura, como antigamente os
imperadores persas se desfaziam de seus sápatras...
Não sendo previsível que, em escassos
meses, o instituto do referendo, conhecido de desde os romanos, tenha mudado de
conteúdo e a palavra, seja em que língua for, mudado de sentido, como
compreender então possa ser bom hoje o que era abominável ainda ontem?
Será que a senhora Merkel não pretendia
o referendo, quando ela considerava que poderia por em causa a sua estratégia e
as suas imposições, mas o mesmíssimo referendo lhe daria jeito para se
desembaraçar do “problema grego”, atravessado na garganta das políticas
liberais, porquanto testemunho, em carne viva, do desastre que tais políticas
provocam?
A pergunta é redundante, pois bem
sabemos, que perante o altar dos mercados financeiros “toda a virtude é castigada” e não há razão ou fundamento que não
seja a sua gula.
Não os povos, nem a grandeza dos homens
(e das mulheres). Apenas a tosca e mesquinha consagração de que os "fins justificam os meios"...
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Há quinhentos anos Maquiavel, com sua
pena arguta, escreveu que “mais
facilmente se conserva uma cidade habituada a viver livre através do consenso
dos seus cidadãos do que de qualquer outro modo...”
...
e
que “a recordação da liberdade e das
antigas instituições, as quais nem pela acção do tempo nem pela concessão de
benesses se apagarão da sua memória” (dos povos subjugados).
Mas de que serve? Tais sensatas sentenças
faziam sentido quando na Europa (e na Alemanha) vicejavam “príncipes da política” e leitores de Maquiavel.
Hoje, estamos rodeados de amanuenses...
10 comentários:
Só recebo más novas, que coisa!!
E sabes que foram atacadas as sedes do BE e do CDS??
Ao que chegámos,,,
Fica bem
O futuro da Europa joga-se na Grécia, e em várias vertentes. Não vou agora aqui traçar cenários, que os há para todos os gostos, deixo apenas o desejo de venha aí a mudança, e para melhor.
Abraço
“a recordação da liberdade e das antigas instituições, as quais nem pela acção do tempo nem pela concessão de benesses se apagarão da sua memória”
Que se lembrem de mim, Clistenes, de meu nome...
De longe e apreensiva, torço para o bem de Portugal e da Europa.
Um grande bj querido amigo.
"Era esquisito, e inteiramente verdade; tudo o que não se podia compartilhar… esvaía-se em pó."
(Virginia Woolf em: Mrs. Dalloway)
Desejo dias melhores pra todos nós.
Beijo
"estamos rodeados de amanuenses" de mangas-de-alpaca merkelizados e de cultura novo-riquismo neoliberal.
As consequências estão na casa de cada um de nós...
Um abraço.
"perante o altar dos mercados financeiros “toda a virtude é castigada” e não há razão ou fundamento que não seja a sua gula."
Como é difícil de aceitar uma coisa assim. Será que ficámos todos loucos e nem demos por isso?
L.B.
Tens razão
só a Académica brilhou no preto
A Europa unida não terá futuro, quando tivermos este tipo de políticos
Saudações amigas
Não creio que os amanuenses mereçam tal equiparação.
Mas, mesmo que possa parecer maquiavélico pouco creio que a Grécia, de um ou outro modo, abandone o círculo do dourado Euro. Veremos...
abraço.
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