sábado, março 26, 2011

O DIA SEGUINTE...


Durante a discussão na Assembleia da República do novo pacote de austeridade ecoou no hemiciclo, não me recordo a que propósito ou por quem, o bombástico adjectivo “patético”. De facto, apropriado. Não encontro outro adjectivo – patéticos!

A democracia portuguesa entrou em decisivo declínio, patéticos que são os figurões que a expressam. Não falo da ausência de inspiração ou rasgo – que o plástico em que são formatados não permite! – mas do paroxismo de anémonas em estertor em que a democracia se agita. Patéticos!…

Patético o discurso incendiário do Presidente da República no acto de posse, a mesquinhez de seu ressentimento e a gestão manhosa de seus silêncios políticos. Patético o Primeiro-ministro, seu “maquiavelismo” ronceiro (coitado de Maquiavel!), seu calculismo político, sua enormíssima jactância, sua presunção inflamada de salvador da Pátria – ou ele ou o dilúvio!...

Patética a gula política do líder do PSD, a pressa em ser governo (nunca ninguém lhe terá dito que “gatas apressadas dão à luz gatinhos mortos”?), a enorme “rasquice” de vergar a espinha perante os poderosos e aceitar “lá fora” o que se veemente se condena “cá dentro”…

Patético vê-lo encolher o rabinho e saltar pressuroso do regaço da senhora Merkel, depois de dois azougados piparotes da dama. Patéticas, as juras e promessas que, de Sócrates herdará (se herança houver) a determinação de aplicar, com mais força, a mesmíssima receita e a mesma devoção aos mercados… 

Patéticas as “angústias” do patriarca So ares!... Patético o discurso mole e redondo de Sampaio, ladrando à Lua e reclamando não sei o quê!... (Dizem-me que Eanes também falou, mas como tenho sempre dificuldade em percebê-lo não sei o que disse – mas foi com certeza patético!...).

Patético ver a senhora Merkel, do alto da sua majestade, no Parlamento alemão, vociferar contra uma deliberação soberana (?) do Parlamento português.

Patética a esquerda a votar com a direita! Embora aqui compreenda melhor a “inevitabilidade”, perante o rumor das ruas e em nome das vítimas de uma política injusta.

Claro que Sócrates merece a demissão, que apenas perde por tardia! Mas também o País merece mais e melhor que a remoção de Sócrates para os anais da nossa patética história recente, trasvestida de governo socialista.

Sejamos claros. Naquilo que alguns designam por “post democracia”, teorizada a partir da queda do muro de Berlim, a representação política já não pertence aos cidadãos, embora que estes continuem a votar e eleger democraticamente os parlamentos, fonte de legitimidade dos governos. Formalmente o poder ainda lhes pertence, mas o efectivo poder é exercido por uma nova casta, que representa os “poderes fácticos”, designadamente, poder económico e financeiro.

Para essa nova aristocracia de poder político, é completamente indiferente o senhor Sócrates ou o senhor Passos. Desde que, naturalmente governem conforme os ditames dos sacrossantos mercados, quer dizer – chamemos o nome às coisas! – governem conforme os interesses do capital e seja dada prioridade às soluções politicas de quem de facto manda.

Os interesses dos países e dos cidadãos que formalmente elegem os parlamentos e legitimam os governos, pouco importam nesse jogo poder efectivo, que realmente condiciona e determina as suas vidas.

Neste quadro, a esquerda portuguesa assumiu uma exigente responsabilidade, ao contribuir para derrubar Sócrates do seu pedestal. É tempo agora de agregar em vez de dividir. É tempo de diálogo franco e aberto, de transparência, de capacidade para esquecer o acessório e o secundário.

E estabelecer com clareza os objectivos, as medidas, enfim constituir um programa mínimo de esquerda, realista, capaz de mobilizar aqueles que, sendo potencialmente eleitorado de esquerda, foram engrossando a grande massa abstencionista que caracteriza hoje os actos eleitorais.

Tarefa difícil, sem dúvida, mas tarefa em que é necessário porfiar. E, em nome de uma verdadeira política de esquerda, acabar, finalmente, com patéticas divisões...

Como a sanidade democrática e o País reclamam…  

13 comentários:

Rogério G.V. Pereira disse...

Meu caro,

Concordo que é urgênte "constituir um programa mínimo de esquerda, realista, capaz de mobilizar aqueles que, sendo potencialmente eleitorado de esquerda, foram engrossando a grande massa abstencionista que caracteriza hoje os actos eleitorais.". Acho até que não seria dificil transpor para uma base de discussão o entendimento (e até algumas discordancias) que percebi existir entre João Ferreira do Amaral, Carvalho da Silva e Henrique Neto, na Mesa Redonda publicada no último número da Seara Nova. A questão (inultrapassável) é a aceitação do paradigma da inevitabilidade das politicas prosseguidas por parte do PS que se prepara (quanto a mim) para manter Sócrates na liderança, apoiando-se até na opinião favorável das instancias europeias (e de Angela Merkel) quanto ao PEC que fez precipitar a actual crise politica...

AC disse...

Um texto lúcido.
Contudo, se me permite, perante os ditames na nova organização mundial, parece-me que está tudo por fazer, com os políticos locais ainda a fazer de conta que mandam alguma coisa.
Um enorme desafio se avizinha, não só para nós, portugueses, mas para todos os cidadãos do mundo.

Abraço

hfm disse...

Patético tudo e todos que "cheiram" a política neste nosso país. Pequeninos. Roidinhos. Em capelinhas.

C Valente disse...

Um triste espectáculo, palavras palavras , políticos a olhar para os seus interesses e não do país, tristeza
Saudações amigas

C Valente disse...

Um triste espectáculo, palavras palavras , políticos a olhar para os seus interesses e não do país, tristeza
Saudações amigas

mdsol disse...

Um programa mínimo de esquerda realista... e quem está disposto a "abrir" o seu quintal? Antes estivesse!

:)))

lino disse...

Há poucos dias, ao pesquisar sobre a origem da expressão "um povo que não se governa nem se deixa governar", descobri que o nome Hispânia, do qual éramos parte no tempo dos romanos, significava "país de coelhos". Felizmente, o Minho não fazia parte da tal Hispânia.
Abraço

Nilson Barcelli disse...

Toda a AR acaba por ser patética, já que tudo é decidido, cada vez mais, fora dela.
Mas os verdadeiros patetas somos nós... daqui a 2 ou 3 meses lá estamos nós a votar, de novo, para vir mais do mesmo e em doses reforçadas...
Abraço.

lis disse...

heretico meu amor !
Diante desse quadro compartilho a mesma vergonha desses patéticos políticos das nossas nações!
Quem tem medo de tsunamis, terremotos enchentes , qualquer outra tribulação depois dessa
vergonhosa decisão da suprema corte de um país?
aqui derrubaram a Lei do "Ficha Limpa" permitindo os politicos ficha suja de continuarem seus mandatos assim na cara limpa.
Indignação.Estou indignada.
Mas, quem sou eu?

fica me devendo algo pior ok? rsrs

deixo abraço e desculpe o meu amor!
culpa do poema plural. rs
fique bem

Graça Pires disse...

Subscrevo. Eu já não ouço nenhum pela minha sanidade mental...
Um beijo, amigo.

jawaa disse...

Pois é, a sanidade mental... por onde anda ela?

Eu também só pedia que se votasse em massa, que ninguém ficasse em casa1

São disse...

Patético também quem vota sempre nas mesmas criaturas!

Fica bem.

luis lourenço disse...

Meu caro!

Sim muita parra pouca uva...Já chega de retórica. fazem faltam os actos que mostrem a nobreza da política.

abraço,

Véu de Maya

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