domingo, setembro 26, 2010

Horas Baças

Na implosão de cravos
Apenas a raiz
Se finca
E a cor
Em bandeiras
Da fome…
Dias amputados de Futuro
Nos trilhos do Nada…
Descartáveis auroras
De um tempo sem fronteiras
Como chumbo…
E neste arrepio de dor
Uma memória perfumada
Uma vertigem que explode
Nos olhos…
E carnívora se ergue nas bocas
Em apoteose de flor sanguínea
No corpo imaculado
De Tragédia pronunciada…
Como cristal aceso
Em noite de facas…

quinta-feira, setembro 23, 2010

Intervalo Forçado...

O meu computador "endoidou". Precisa urgentemente tratamento por técnico especializado ou, porventura, a sucata. De qualquer forma, obriga-me a intervalo forçado, que espero seja breve...

Sabem do meu prazer em ler-vos.

Até breve. Beijos e Abraços

segunda-feira, setembro 20, 2010

O Zeca anda em baixo... Parte II

O Zeca, como por certo adivinharam, caiu nos braços do Artur, soltando expressões de júbilo de adolescente:

- “Ó pá, ó Fontes, nem imaginas o prazer que me dá a tua presença!”:-balbuciava o Zeca, num abraço arrebatado, acompanhado de dois sonoros e inesperados beijos, na face escalavrada do bom do Artur Fontes... (A mim que, por vezes, tenho a presunção de ler a alma humana, pareceu-me ver soltar-se, intimamente, uma lágrima jubilosa daquele corpanzil um pouco fanado do Zeca...)

E o Artur, procurando libertar-se, num sorriso pleno de subentendidos:- “Já chega, pá!... Estás a ficar a ficar piegas!...” E, perante a gargalhada geral:- “ E essa dos beijos não te perdoo. Que assedio é este? Queres levar-me ao altar, ou quê?!...

É assim o Artur! De uma ironia, por vezes cáustica, em que disfarça uma generosidade e uma sensibilidade sem mácula... Sem nunca virar a cara a uma boa refrega nas causas em que acredita....

Assim, desde sempre... Quando jovens, nós fazíamos, (mais ou menos), a “revolução de café”! Porém, o Artur abalançava-se na aventura de “passador de fronteiras”, na tentativa de arrebatar à guerra colonial os jovens de qual se alimentou por longos anos.

A iniciação do Artur nessas lides teve, porém, o seu quê de atribulado. Beirão de gema, daquela estirpe (cada vez mais rara) de “antes quebrar que torcer”, voluntarioso quanto baste, movido pela mais genuína amizade, o Artur prontificou-se, em certa ocasião, a colocar em França um amigo, cujo nome não vem para o caso, que gemia, pelas esquinas e cadeiras de café, o pavor de embarcar para África, cuja mobilização estava iminente...

E foi assim, que no dia aprazado, os dois rumaram à fronteira, algures no norte do País. A noite de breu gelava. A chuva fustigava o rosto. As urzes rasgavam a roupa e a carne e os silvos do vento, ecoando nos penhascos, ganhavam dimensão apocalíptica. Em cada ruído inesperado, passador e fugitivo viam a aproximação da polícia. Desconhecedores do local, perderam o rumo, às voltas em círculo, mal se afastando 10 km do local da partida.

Até que por fim, de madrugada, apavorados e rendidos, tiveram um rasgo de bom senso e desistiram. O fugitivo foi entregue, no Porto, a “quem devia ser entregue”, isto é, a quem estava preparado para a missão, que então sim, mais tarde, pelos circuitos da clandestinidade, acabou por se refugiar em França...

Mas pensam que o desaire afectou a determinação do Artur?!... Pelo contrário, serviu-lhe de aguilhão e estímulo. Hoje, confessa, com uma pontinha de orgulho a brilhar nos olhos, que passado algum tempo, conhecia, como ninguém, todas as veredas, caminhos e atalhos, ao longo de toda a fronteira com Espanha, que lhe permitiam ludibriar a vigilância fronteiriça e os esbirros da PIDE.

Para a aquisição de tal “know how”, nas suas múltiplas deslocações a Espanha permitia-se correr riscos e passar a salto, estudando a topografia do terreno e memorizando pormenores, de forma a que, no dia em que fosse necessário, não haver hesitações ou dúvidas.

Aliás, o método tinha tanto de simples, como de eficaz. Munido da respectiva carta topográfica da área geográfica em causa, encenava uma viagem turística a Espanha e seguia com a família de automóvel até a proximidade da fronteira.

Resguardada que fosse alguma distância de segurança, apeava-se e os acompanhantes prosseguiam normalmente submetendo-se aos respectivos controlos fronteiriços. Entretanto, o Artur avançava a pé e a corta mato, de carta topográfica em punho, registando mentalmente qualquer acidente de terreno, qualquer marca ou sinal, memorizando uma espécie de “abecedário do território”, que lhe permitiria mais tarde decifrá-lo, mesmo de noite, quando fosse necessário

Do outro lado da raia, no local combinado, os acompanhantes aguardavam, simulando, no caso de aproximação da Guarda Civil, uma avaria ou outro qualquer expediente, que despistasse a vigilância policial, até o Artur chegar e poderem prosseguir viagem...

No regresso, o mesmo percurso para cimentar o itinerário no registo da memória!...

Foi, aliás, a propósito de uma dessas viagens de reconhecimento, que o Artur contou naquela noite, já não sei a que propósito, uma cena digna das melhores anedotas que, sobre o negrume daqueles tempos, se conhecem...

O episódio conta-se aliás em poucas linhas. Já em fins do regime, algures na fronteira do Alentejo, de regresso de Espanha, o Artur, acorrentando ao seu destino de mapear na memória os percursos da evasão, deparou, em sentido contrário, na vereda onde seguia, já no lado português, um soldado da GNR, que à distância lhe pareceu acenar-lhe....

Que fazer?!... Recuar não podia, pois seria denunciar-se; prosseguir era cair na boca do lobo, que é como quem diz na ferocidade da polícia portuguesa. O dilema, porém, demorou uns escassos segundos: - “P´ra frente é que é o caminho e seja o for!...” , animou-se o Artur, apelando ao melhor do seu sangue frio...

Meteu a mão na algibeira das calças, onde por cautela, trazia engatilhada, para qualquer emergência, uma pequena pistola e desabafou para os seus botões:

-“De homem para homem, neste ermo, não me apanhas! ao primeiro gesto hostil ficas estendido no chão com um tiro na testa!...

E prosseguiu caminho o Artur, com os nervos e músculos retesados, de encontro ao inevitável guarda. Ao cruzarem-se na estreita vereda, o guarda correspondeu amistosamente à saudação e seguiu como se nada fora, o que o levou o Artur a presumir que “daquela já estaria safo”...

Eis senão quando, uns metros andados, o guarda se voltou e gritou:

- “O senhor aí, faça favor!...”

Gelou o sangue nas veias do Artur e a mão acariciou a coronha da arma. Voltou-se, calmamente, como se nada fosse:

- “Que se passa, senhor guarda!...

E o agente da autoridade, a quem a Nação tinha confiado o zelo das fronteiras e, quiçá, a honra da Pátria, que uns desnaturados, a soldo do comunismo internacional, abastardavam, num sorriso comprometido, indagou timidamente:

- “Será que por este caminho chego a Espanha sem ninguém me ver?!...Sabe como é - a minha mulher faz anos em breve e gostava de lhe poder oferecer uns caramelos!...

Respirou fundo o Artur. E, na sua melhor bonomia, respondeu, sorrindo:

- “Sem dúvida, senhor guarda! aqui tem a prova, acabo de o fazer!...

E, cada um, seu destino...

Nesta altura da narrativa, o Zeca, até aí um pouco apagado, erguendo-se da cadeira, interpelando, azedo, o Artur:

- “És um grande nabo!... Se em vez da política te tens dedicado ao contrabando de café, hoje podias ser um grande nababo!... Talvez comendador, de medalha ao peito"...

E o Artur, sempre tão austero e arredio a modas, num sorriso tolerante, socorreu-se de um obsessivo slogan, instalado nas noites televisivas, para afirmar:

- “Lá poder, podia!... Mas não era a mesma coisa!...”

Assim os homens. Alguns homens...






sábado, setembro 18, 2010

Meu amigo Zeca anda em baixo...

Lembram-se do meu amigo Zeca? Esse mesmo, o “bon vivant”, o alentejano de Beja, economista do Quelhas (helás!), solteirão impenitente e protector de donzelas desvalidas...

Pois bem, como ele próprio, amargamente, confessa, o meu amigo “anda em baixo”. O tempo vai deixando suas marcas e a barriguita aumenta, na proporção inversa em que mingam os atributos, que lhe definiram o carácter e traçaram o destino, como noutras ocasiões contei... aqui

Até mesmo as celebradas jantaradas, no seu apartamento debruçado sobre o Tejo, têm vindo a rarear, não tanto pelo “crise” a que a sua empresa de auditoria não é indiferente, mas, sobretudo, pela “falta de pachorra”!...

Como se compreende, o abatimento do Zeca causa preocupação a seus amigos, bem sabendo nós todos, porém, que passada a primeira curva, quer dizer, afogada a depressão nas cálidas vagas de uma nova conquista aí o teremos, de novo, a zarpar, remoçado e excessivo...

Mas enquanto dói, dói fundo!... Decidimos, por isso, alguns dos amigos mais chegados, fazer-lhe uma surpresa e mimar o Zeca com umas garrafas e umas caixas de charutos, em abono da sua bem fornecida garrafeira... E mais: levamos connosco o Artur Fontes, de quem ainda não vos falei, mas por quem o Zeca nutre estremada amizade e que – sabíamos – havia anos que, por uma razão ou outra, não se encontravam...

Diga-se de passagem que o Artur exerce sobre todos nós uma certa admiração, que decorre, naturalmente, da sua forte personalidade, a raiar a teimosia, mas sobretudo pelo seu percurso de vida, ponteado pelo exercício da coerência e pela volúpia da acção que o levou a algumas invejáveis peripécias e... algumas imprudências...

Terminada licenciatura em Direito, o Artur rumou à suas raízes na Beira Alta, onde organizou camponeses em luta por direitos ancestrais sobre os baldios, contra os serviços florestais e os esbirros do fascismo, numa saga digna de Aquilino Ribeiro e de seu célebre romance “Quando os lobos uivam...”

Após o “25 de Abril”, o Artur Fontes desempenhou, episodicamente, funções de relevo na Administração Pública na área da agricultura e da reforma agrária. mas como bem se sabe a “revolução devora (quase) sempre os seus melhores filhos”, pelo que a curto prazo foi afastado das funções, num contexto, assaz divertido, mas que, de momento, não vem para o caso relatar...

A partir daí, refugiou-se o Artur Fontes numa advocacia honrada, colocando o seu saber e o seu talento ao serviço das causas em que acredita, longe dos holofotes das grandes causas e grandes interesses...

Foi, portanto, acompnhados pelo Artur que, numa tarde cálida de fim de Verão fomos ao encontro do meu amigo Zeca, na convicção de que o prazer de uma noitada de convívio, com umas larachas sobre política, zurzindo o Sócrates e quejandos, temperadas com umas incursões no futebol e as “desgraças” da equipa de todos nós, teriam o sortilégio de mudar seu humor doentio e inverter a curva descendente da depressão...

O relato da reunião fica para próxima crónica, advertindo-vos, porém, desde já, que o herói da narrativa, será o Artur e não o Zeca e a sua voragem femeeira.

Coisa séria, portanto...

quarta-feira, setembro 08, 2010

“Fazer o que ainda não foi feito...”


Como se sabe, toda a linguagem é “ideológica”. Não há “inocência” na Palavra ou neutralidade possível em qualquer “sistema discursivo”, seja ele Literatura, Moda, Publicidade ou Política (ou Música).

Por outro lado, a palavra, enquanto signo de um discurso narrativo, arrasta consigo, para poder significar, a ambivalência “mitos”, que ocultam, por um lado, o que por outro pretendem desvendar. E, nesse jogo de véus, nesse paroxismo de ocultação/revelação, o Verbo (e o mito) alcançam significação e expressividade...

No caso em epígrafe, o infinito futuro do “que ainda não foi feito”, oculta a ponderabilidade do presente e a acumulação de sentido daquilo que “está feito” e que constitui, afinal, a justificação do enunciado, seja lá o que for o que cada sujeito do discurso pretenda ultrapassar (ou subverter) na acção de fazer ...

O enunciado em referência, que no caso serve de exemplo, atingirá assim o alvo, quer dizer, ganhará apenas plena significação, no respectivo contexto leitura, que dizer, a partir do “lugar ideológico" em que sujeito interpelado se coloque - tanto poderá ser a mundividência individualista de um “carpe diem”, como a altruísta e generosa dimensão da participação cívica e social...

Na realidade, como dizem os autores, a ideologia, que nunca se reconhece como ideológica, reflecte as condições materiais da existência dos indivíduos, numa relação inversa, de forma a que, quanto mais cinzento o quotidiano mais colorido o desejo de uma vida outra, que a ideologia promete...

Tanto mais “a fazer”, quanto o que “é feito” não satisfaz...

Também assim no discurso jurídico. Nunca como hoje a “ideologia” dos direitos do homem foi tão insistente! À geração dos tradicionais direitos de cidadania, oriundos da Revolução Francesa, juntam-se agora, nas constituições modernas e instrumentos jurídicos de âmbito internacional o direito ao trabalho, à segurança social, à saúde, à educação, o direito à habitação, à água e ao saneamento, etc.

Ao que se sabe, está agendado para a reunião da Assembleia Geral das Nações Unidas, no próximo Outono, a discussão do Novo Tratado Internacional dos Direitos Humanos, entretanto aprovado no Comissão dos Direitos Humanos, em Genebra, que inclui estes novos direitos humanos de segunda e terceira geração.

Alguns lhes chamam o “kit de sobrevivência” da Humanidade, o que dá a medida da relevância destes novos direitos, ao menos no plano da “ideologia jurídica”, bem se conhecendo que os direitos económicos, sociais e culturais emergem dos valores do socialismo e da luta dos trabalhadores do decurso do século passado...

Daí as resistências, atrasos e incompreensões...

Mais vale tarde que nunca. Saudemos, pois, a omnipresente ideologia que atribui às conquistas sociais e avanços históricos da Humanidade a “dignidade do Direito”; sobretudo, se tiver âmbito universal, no quadro de um Tratado Internacional dos Direitos do Homem.

Mas uma coisa são os efeitos especulares da ideologia. Outra são as condições reais em que os direitos humanos se exercem e que a nossa pequena escala nacional nos permite avaliar.

O feroz desmantelamento do chamado “Estado social” e o retrocesso social que representa aí estão, pungentes, como ferida aberta no corpo das sociedades europeias, para não me alongar no elenco dos atropelos por esse mundo fora dos direitos humanos, sejam eles direitos de cidadania, ou direitos económicos, sociais e culturais...

Apesar das promessas jurídicas que as leis nacionais e os tratados enunciam.

Contradições do sistema capitalista? Direi que, verso e reverso da ideologia dominante, que no seu percurso de dominação e interpelação dos cidadãos, nega o que majestosamente proclama...

Não nos deixemos cegar!
E cada um, à sua medida, faça “o que ainda não foi feito...”


quinta-feira, setembro 02, 2010

NÃO HÁ FESTA COMO ESTA!

Festa do Avante!

"Música, cultura, desporto, ciência, gastronomia, solidariedade, convívio, são apenas algumas das componentes que fazem desta Festa uma realização única em Portugal e no mundo, intimamente ligada aos valores da liberdade, da democracia e do socialismo, que expressa de uma forma única a criatividade, a imaginação e o sonho de emancipação do povo português".

Sem Pena ou Magoa

  Lonjuras e murmúrios de água E o cântico que se escoa pelo vale E se prolonga no eco evanescente…     Vens assim inesperada me...