segunda-feira, dezembro 01, 2008

deixo que os rios secos...

deixo que os rios secos e as tempestades de sons ausentes
na memória de outros Maios se inscrevam na saliva
das palavras balbuciadas em que digo amor
em fim de tarde...

assim administrando amoras tardias que recolho
em círculos de sol de lábios ciosos - gestos inesperados
como frutos desprendendo-se de maduros -
ou chuvas de deserto...

viajo caminheiro sem pressa recostado nas bermas
celebrando as sombras e as festivas giestas outonais
sorvendo o mel das silvas soltando revoadas de
tordos espantados que riscam o abismo dos olhos...

e aí me perco - na entrega matizada de cores quentes
nos odores persistentes na humidade translúcida de beijos
na generosidade dos seios no declive dos lábios -
cio de colheitas na sofreguidão dos cestos antes das uvas...

ondas desbragadas que subjugam - ferida aberta ou lava
ou lume que consome - e festa que explode
em clarão de madrugada...

28 comentários:

hfm disse...

De uma beleza que chega a doer.
"viajo caminheiro sem pressa recostado nas bermas" só assim percebo as viagens, mesmo as interiores.

Tinta Azul disse...

Uma pessoa até fica sem fôlego...

Depois vai daqui, devagarinho, sem pressa, recostada pelas bermas...


Muito bom!

Bjs

mariam [Maria Martins] disse...

Herético,
já li n vezes,
para mim, dos que já li, será porventura um dos seus mais belos poemas.
pleno de cores, odores e sentires, neste Outono que nos diz adeus. Adorei

boa semana
um grande abraço e um sorriso :)
mariam

mdsol disse...

Já sabia que o post de hoje ia ser... e tanto! Valeu!
:)))

Maria disse...

Belo...
intenso...
forte...
... para quando um livro?
(acho que já perguntei...)

Beijos
e beijos

Peter disse...

Belíssimo poema! Já cansa repetir-me, mas que hei-de dizer se eu gosto mesmo dos teus poemas? São poemas de "madrugadas explosivas" e não poemas herméticos, que só o poeta compreende e os comentadores fingem compreender.

A minha ignorância é tanta que só vi 1/2 de um filme de Manoel de Oliveira. Saí a meio...
Mas vais ver que quando o venerando cineasta completar 100 anos, todos se irão empurrar para tecerem loas sobre filmes que não viram.

vida de vidro disse...

O poema explodiu na minha manhã gelada. Dele saiu o calor de outros Maios. Belo! **

Maria P. disse...

"na memória de outros Maios..."

Lindo, todo tão lindo.

Bjo*

luis lourenço disse...

tocaste, meu caro herético, no céu poético...com a bravura dos dias que nos ensinas tão bem enfrentar...lindíssimo de viver...


abraços

São disse...

Que o clarão da madrugada te ilumine sempre!
Fica bem.

C Valente disse...

Deixa-me respirar muito bom´
Saudações amigas

tulipa disse...

DEZEMBRO COMEÇOU MUITO GELADO
o meu coração também está gelado, este frio não ajuda a aquecer...
nem o que me rodeia!!!

Tenho andado um pouco ausente, 1º porque estive 10 dias fora de Portugal, fui de férias à Índia. Cheguei dia 20 e deparei-me com uma situação muito grave de doença na família, que me tem deixado de rastos...sem vontade de nada...
Minha sobrinha com apenas 26 anos está muito mal à espera de um transplante de coração...
Dói muito sentir a impotência de nada poder fazer...quando amamos esse alguém, tão jovem que é.

Deixo-te um abraço de alguém que precisa de sentir que me abraçam de verdade.

o Reverso disse...

quisera saber dizer as palavras que os poemas que por aqui leio merecem. mas não sei.

assim, leio e volto a ler.

e vou por aqui abaixo.

um abraço.

mundo azul disse...

Fico em pé para aplaudir o seu poema!

É um SENHOR poema...


Beijos de luz e um dia muito feliz!!!

Licínia Quitério disse...

Celebração de eternas festas que nos percorrem nesta caminhada sem pressa de quem já conheceu muitas estações.

Um abraço, um abraço.

© Piedade Araújo Sol (Pity) disse...

muito bonito, até fiquei, meio entranhada e reli-o em voz alta para melhor "sentir" as palavras.

parabéns!

beij

Nilson Barcelli disse...

O que escreves são rios a transbordar de belas imagens poéticas.
Algumas bem complexas... cuja descodificação leva o seu tempo e que, por certo, nem sempre serão inteiramente coincidentes com a ideia do autor.
Mas a poesia é assim mesmo.
Abraço.

SILÊNCIO CULPADO disse...

Heretico

Poema empolgante de paixão outonal, de caminhadas sabiamente vividas, de desejos ainda acordados.

Lindo, simplesmente.

Abraço

Graça Pires disse...

Um belo poema neste outono e na memória de outros Maios...
Um abraço.

**Viver a Alma** disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Alvarez disse...

Que força é essa amigo... que emanam dos teus poemas?

Parabéns!...

Alvarez

**Viver a Alma** disse...

xxxxxiiuuu!
Sem ruído...
fique em silêncio
afague esse olhar, sentido de Outono,
em tons laranja e caramelo.
a desatenção do momento...
aviva a saudade e arrebatamento pela Primavera - multicôr.

xxxxxiiuuu!
fique aí...

Maria Clarinda disse...

(...)e aí me perco - na entrega matizada de cores quentes
nos odores persistentes na humidade translúcida de beijos
na generosidade dos seios no declive dos lábios -
cio de colheitas na sofreguidão dos cestos antes das uvas(...)

Simplesmente lindo!!!!
Jinhos mil

M. disse...

Belíssimo!

Mel de Carvalho disse...

retenho as imagens, as metáforas, na beleza ímpar que só a poesia, a boa poesia, ofereça aos cestos ciosos das colheitas.

esta viagem pelos silvados, foi, nesta manhã chuvosa, belíssima.

grata, Herético. Bem-haja
Mel

Oliver Pickwick disse...

Continuo fã e freguês da sua poesia atemporal.
Então, além da heresia, temos outra faceta em comum, o gosto pelos carros de bois.
Um abraço!

Isamar disse...

Lindo! Não tenho palavras para descrever o que se sente quando se lê um poema assim. Este género literário faz parte do meu quotidiano. Para quando um livro?

Beijos

Stella Nijinsky disse...

Olá Heretico!

Enquanto lia e me arrepiava pensei logo que este é o melhor poema teu que já li.

Quando vi depois os comentários vi que não fui a única a achar!

Está maravilhoso, colorido, real. Ao nível de escrever sobre o que escreve!

Beijo,

Stella

Sem Pena ou Magoa

  Lonjuras e murmúrios de água E o cântico que se escoa pelo vale E se prolonga no eco evanescente…     Vens assim inesperada me...