domingo, setembro 07, 2008

Cynthia McKinney (USA) - Uma candidatura alternativa...

Cynthia McKinney, uma corajosa ex-congressista negra eleita pelo Estado da Geórgia, tornou-se numa das mais importantes activistas e líderes da esquerda norte-americana e dos movimentos progressistas no país. A sua militância contra a guerra no Iraque, pela destituição do presidente George W. Bush, em defesa das vítimas do furacão Katrina e na denúncia do papel do governo no desalojamento de milhares de pessoas, valeu-lhe o rótulo de “demasiado negra e radical” para passear nos corredores do Congresso.

Por esse motivo, foi expulsa não uma, mas duas vezes pela direcção do Partido Democrata, o qual, tal como o congénere Republicano, é um partido do imperialismo. O ano passado, McKinney cortou definitivamente os laços com os Democratas.

A 12 de Julho último, McKinney e a activista de origem latina Rosa Clemente, foram escolhidas pelo Partido Ecologista para se candidatarem à presidência e vice-presidência dos EUA, respectivamente. A nomeação por parte dos ecologistas coloca McKinney nas assembleias de voto de 20 Estados. Isto não é coisa pouca num país onde a classe dominante montou um sistema que levanta enormes obstáculos ao surgimento de argumentos eleitorais independentes e alternativos aos dos dois maiores partidos.

A campanha protagonizada por Cynthia McKinney vai buscar grande parte das suas propostas ao programa provisório do ainda embrionário Partido da Reconstrução, formado por activistas de Nova Orleães e do Golfo do México, os quais, junto com grupos de todo o país, exigem justiça para os sobreviventes do Katrina e a reconstrução das regiões da Costa Sudeste da América do Norte.

O programa reivindica, entre outras coisas: igualdade de direitos para os negros norte-americanos; realojamento dos deslocados do Katrina; políticas eficazes de emprego, saúde e habitação; fim da política racista e da repressão policial; fim do complexo militar-industrial; retirada imediata do Iraque.

McKinney declarou-se igualmente contrária à ocupação do Afeganistão e a qualquer envolvimento dos EUA num ataque ao Irão, e expressou claramente a sua solidariedade para com a luta do povo palestiniano. Quanto às questões envolvendo o Zimbabué e o Darfur, a candidata pôs a nu os contornos reaccionários da intervenção de Washington no continente africano.

A Campanha de Cynthia McKinney vai enfrentar grandes dificuldades na medida em que esta eleição presidencial apresenta aspectos que a diferenciam das antecedentes. Barack Obama é o primeiro negro a ser nomeado candidato por um partido do sistema, e, assim, pode mesmo vir a ser o primeiro presidente negro dos EUA. Muitos estão compreensivelmente entusiasmados com a hipótese, particularmente os afro-americanos. Independentemente do quanto Obama se possa a aproximar das posições da direita conservadora, certo é que os eleitores negros se vão mobilizar procurando concretizar uma esperança que a maioria julgava impensável há apenas um ano atrás.

Para além dos eleitores negros, muitos votarão em Obama por razões, que consideradas no contexto histórico norte-americano, são progressistas. Muitos outros não vão votar em Obama pelo inverso, ou seja, porque o seu nome induz que o candidato é muçulmano, ou simplesmente porque é negro. Raça, ou o que muitos de nós chamamos de “questão nacional”, joga nas eleições deste ano um papel central.

A possibilidade de triunfo de Obama pode ainda ser um sinal de que o período político dominado pela reacção ultra-conservadora, que provocou fortes recuos entre a classe trabalhadora e enfraqueceu o movimento revolucionário, está a chegar ao fim.

Acresce um lado negativo a estes desenvolvimentos contraditórios. Caso Obama venha a ser eleito, o que é ainda de todo incerto, a classe dominante nos EUA terá um político negro que os pode ajudar a salvar o conturbado império. Uma administração com Obama como face de um Estado imperialista pouco ou nada muda no fundamental da questão, mas enquanto mistificação assinala toda uma nova situação.

Independentemente de quem venha a ganhar as eleições, a magnitude da crise mundial do imperialismo, centrada nos EUA, vai desafiar todas as forças que partilham uma orientação socialista, anti-imperialista e comprometida com as classes trabalhadoras. As condições materiais para o ressurgimento do movimento operário e da luta dos trabalhadores nos EUA pode em breve atingir níveis próximos dos registados na década de 30.

A luta não pode ficar confinada à arena eleitoral, especialmente quando os capitalistas dominam inteiramente esse processo. A campanha de McKinney lança as bases para uma aliança radical entre latinos, negros, asiáticos, nativos americanos, sindicalistas e progressistas, imigrantes e sectores afectos à luta pelo socialismo e apresenta um enorme potencial de crescimento. Pode ajudar a trazer para as ruas uma linha política de luta de massas”


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Larry Holmes é colaborador do jornal norte-americano Workers World e da revista Seara Nova, podendo conhecer-se um artigo do autor, sobre este tema, no nº1704 - Verão 2008.

10 comentários:

luis lourenço disse...

Os labirintos da política-alta ou baixa-Bem hajam os que lutam por causas nobres, mesmo à margem do poder político.

abraço

mdsol disse...

Gostei de ler

éme. disse...

(Um desabafo antes de dizer o que o lido me leva a escrever:
Este artigo reconduziu-me, de algum modo, à impressão estranha que tinha quando era pequenita. Já explico: na televisão passavam filme de índios e cowboys, passava o Tarzan, o Sandokan, vi A Cabana do Pai Tomás, A Escrava Isaura... não percebia nunca por que era razão a (des)razão dos horrores que conduziam àqueles enredos. Vivi muito tempo com vergonha desta minha cor, branquela que me fazia pertencer ao grupo daqueles que me pareciam sempre - os Maus.)

A ler, agora, estas coisas sérias, pelo menos trinta anos mais tarde... bem, já percebi que não é com "vergonha" que farei o que quer que seja que tenho (temos todos) a fazer.
Alguma coisa tem mesmo de estar a mudar.
O facto "simples", por si só, destas duas candidatas Serem, de facto, Candidatas, é prova de que a mudança está no ar, a caminho, a chegar, a começar (a dar-se)!
É preciso estarmos, cada vez mais, atentos/as.
É urgente mostrar que estamos presentes.

tardes mágicas disse...

Haja quem tenha a coragem de assumir as lutas realmente importantes, sobretudo em condições tão complicadas como são as dos Estados Unidos em que tudo está polarizado à volta dos dois grandes partidos.

batista disse...

pouco, quase nada, conhecemos além daquilo que a grande mídia quer que saibamos... a não ser quando interagimos com sítios como o teu, Amigo.

deixo um abraço fraterno.

bettips disse...

Completamente esclarecedor e pondo no lugar as nódoas que nos servem pelos telejornais e quejandos. Mas que haja então, alguma esperança que o equilíbrio se instale e vençam as forças anti-belicistas.
Abç

Isamar disse...

"A possibilidade de triunfo de Obama pode ainda ser um sinal de que o período político dominado pela reacção ultra-conservadora, que provocou fortes recuos entre a classe trabalhadora e enfraqueceu o movimento revolucionário, está a chegar ao fim."

Que assim seja e que o meu cepticismo não seja premonitório de que tudo continuará na mesma. Quando cairão definitivamente estes preconceitos que não têm qualquer razão para existir?

Beijinhos

mundo azul disse...

Politica nunca me atraiu, pois mesmo que seja ótimos, depois que entram no tablado, todos usam fantasias...


Beijos de luz e o meu carinho!!!

mundo azul disse...

...desculpe o erro...Meu teclado está péssimo!

"...pois mesmo que sejaM..."

M. disse...

Mais um interessante, e necessário, artigo de esclarecimento.

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